As borboletas que surgem do pó

E por fim, o monstro abraçou a moça.
Um abraço forte.
Apertado.
E ele sentiu as mãos dela.
Grudavam forte em sua pele.
A pele gelada dela e contato com a dele.
Um breve contato.
Então, como um trovão repentino, o abraço afrouxou.
Tornou-se fraco.
E o monstro assustou-se.
Sentiu o leve repelir do corpo dela.
Dos olhos  mareados dele, verteram lágrimas.
Cristalinas.
Sinceras.
Como um baque surdo, sentiu seu coração.
Delicado coração, que batia na intensidade da emoção compartilhada.
Delicado coração, que trincava como um vidro.
E do vidro, transformou-se em areia.
Da areia, ao pó.
E pó era o que a moça estava virando.
Vivendo.
O monstro tenta em vão conte-la.
Mas é tarde.
Sente os dedos frios da moça afastando-se.
Por entre seus dedos a moça se esvai.
Desaparece diante de seus olhos atonitos.
A ilusão.
O sonho que um monstro ousou sonhar.
Quando a criatura se ajoelha.
Mãos entre seus olhos.
O pó, aos poucos, muda.
Mutaciona-se.
Primeiro surgem pequenas asas coloridas.
Depois, um corpo fino.
Delicado.
Por fim, alçam voo.
As borboletas que surgem do pó.
Surgem da moça.
Voam livres.
Pelos céus.
Para os céus.
Livres.
O coração da moça.
Amadureceu.
O monstro olha para cima.
Para as borboletas.
Fala.
"E no fim de tudo, céu e terra continuam vivas. Para ela, nada muda e nada acontece. Apenas seu eterno ciclo implacável de amor e perda. Solidão e companhia. Para a vida, o agir de um homem têm o peso de uma folha seca no meio da ventania."


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